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Silva, F. L.. Filosofia e intuição poética na modernidade


vb. criado em 18/08/2014, 11h15m.


index do verbete

aula 1

modernidade e kant

na poética de Baudelaire

Estuda um texto de Kant e a releitura feita desse texto por Foucault.

modernidade, conceito vago porque multidisciplinar, não suscetível de definição simples, não pode ser tratada como conceito filosófico apenas.

modernidade igual iluminismo [1]

iluminismo começa com Descartes, para a maioria, mas alguns acham que começa com Kant, porque foi o primeiro a descrever em tempos modernos a relação entre o sujeito (homem) e o objeto (mundo). o primeiro a descrever a subjetividade como autonomia, independência, liberdade. Kant= filosofia crítica.

Kant, 1780, texto em resposta à pergunta "o que é Iluminismo?". esclarecimento (sinônimo de iluminismo) é o atingimento da maioridade do homem, entendida como a capacidade de usar a razão de forma autónoma, livre da tutela de outrem que informa como pensar e dirige a atividade de pensar. pascal: meus joelhos se dobram diante do rei, mas minha alma não, pois é livre.

a causa da menoridade não se encontra na falta de entendimento, mas na falta de coragem de servir se desse entendimento sem a direção de outro. Sapere aude, ousa saber.

epíteto, filósofo estoico escravo: sou escravo mas meu pensamento é livre.

o pensamento pode ser o lugar da liberdade nas pode ser também o lugar da tutela, do direcionamento, onde o indivíduo está sujeito a outro e não é sujeito do próprio pensamento.

Kant diz que o homem é culpado da sua própria menoridade. o que oprime é menos responsável do que aquele que se deixa oprimir.

põe em a questão a definição de Aristóteles de que o homem é animal racional. Kant acrescenta a necessidade de fazer uso adequado, isto é, livre, dessa razão.

define a menoridade racional e a contrapõe à maioridade racional, São duas formas de pensar antagônicas e entre as quais há uma hierarquia. transição histórica da infância para a idade adulta, mas não só isso, porque as duas formas podem conviver. não se trata de um evento histórico puro e simples, não é a história que vai emancipar o homem, ele é responsável (culpado) da própria menoridade.

homem moderno é aquele que faz uso autônomo da própria razão. liberdade responsável.

mas Kant afirma que não vivia numa época esclarecida, falta muito para isso, mas a humanidade estava em processo de esclarecimento. o esclarecimento é a história do esclarecimento.

não posso dizer que sou sujeito, mas estou em processo de subjetivação.

ainda aceitamos nas nossas crenças coisas que não são produzidas pela nossa razão.

o esclarecimento para Kant não ea meta da história, e depende da Assunção da culpa pela menoridade pelo homem.

a saída é apresentada de maneira ambígua, não é um fato, é uma tarefa é uma missão, o homem do saí do estado de tutela mediante a própria transformação, é um trabalho a ser assumido enquanto tarefa humana.

aula 2

o que é a atitude de modernidade?

A atitude de modernidade é uma atitude crítica, daí porque a filosofia de Kant é crítica (a primeira filosofia crítica); escreveu a crítica da razão pura (defendendo a autonomia teórica, no âmbito científico), a crítica da razão prática (defendendo autonomia moral) e a dos juízos (defendendo a autonomia dos juízos usando como critérios apenas o homem e a comunidade humana, sem apelar para razões transcendentes ou extrínsecas ao universo humano).

Kant defende a coragem e a responsabilidade, e instala a filosofia crítica como forma de entender as possibilidades e limites do conhecimento. Demarca, dentro desses limites, o território da liberdade.

A liberdade para pensar tem que conduzir à verdade e não às ilusóes. Defende o uso próprio e responsável da liberdade de pensar, ou seja, que seja usada para conduzir apenas à verdade.

Foucault explica que esse artigo já demarca os 3 eixos da filosofia de Kant, que se materializam nas três questões que ela contém (e que são um mapa da filosofia): o que posso saber/conhecer, o que devo fazer (como posso conhecer), o que posso esperar (até onde é possível conhecer) (quando a filosofia tiver respondido a essas perguntas terá realizado seu propósito). Kant revoluciona ao discutir o que é pensar, o que é fazer filosofia. A perspectiva de Kant quer redefinir a filosofia dizendo a) com que ela deve se preocupar, b) o que significa pensar, e c) que filosofia é pertinente.

Kant é mais estudado na epistemologia, na metodologia das ciências, mas a maior novidade do seu pensamento não está aí. Quais são as possibilidades de se fazer ciência, como chego à objetividade, quais são as condições de possibilidade de um conhecimento efetivamente objetivo, até que ponto é possível atingir a verdade, em que dimensões ela se apresenta a uma criatura finita.

Distingue uso público e uso privado da razão. Quem exerce cargo público pratica o uso privado da razão, porque pode pensar o que quiser, mas não pode divergir da tradição da instituição a que serve (não tem o direito de questionar o pensamento da instituição); pode pensar pelo pensar, mas não se manifestar; já quem não exerce cargo público pode, na sua vida privada, e na condição de sábio, fazer o uso público da razão para esclarecer os ignorantes.

Kant defende em geral, como critério político, que o indivíduo pode pensar o que quiser, mas tem de obedecer à autoridade constituída (compatibilizar a liberdade do indivíduo com a organização social). Admiração por Frederico II da Prússia, o déspota esclarecido. Mas Kant não explica como compatibilizar essa aparente incompatibilidade, o que não se resolveu até hoje.

Foucault quer que se apliquem as três perguntas ao presente: só o presente é digno de ser pensado.

Kant só foi censurado quando escreveu que a função da religião é provisória, para fornecer a esperança. Porque a lógica indica que o justo deve ser feliz e o iníquo deve ser infeliz. É ilógico, isto é, injusto, que o iníquo seja feliz e o virtuoso seja infeliz. Daí a religião fornece a esperança de recompensa na vida futura. Mas quando o esclecimento se completar, a própria organização da humanidade emancipada fará com que a relação entre virtude e justiça seja realizada pela simples razão, e a religião tornar-se-á desnecessária.

A atitude moderna consiste em pensar criticamente a atualidade, o presente. A atitude moderna não se curva ao peso da tradição nem ao argumento de autoridade. Descartes diz que a miséria de todo humano é ter sido criança, e, como tal, sujeito à introjeção de preconceitos, prejuízos, falsidades e aparências que a cultura reforça na família, na escola e na sociedade, impondo o peso do passado, a tradição dos dogmas e certezas previamente adotadas sem provas. A atitude da modernidade é rejeitar toda essa tradição, toda essa formação viciada, e levar o sujeito a reformar-se; a reforma do sujeito, baseada só na razão é a atitude de modernidade.

Mas a subjetividade autônoma é problemática, muito contraditória, cheia de fissuras, falhas e regressões, porque é uma experiência aberta, cheia de imprevisibilidade.

A liberdade não existe como liberdade realizada, a liberdade é uma história, só existe em processo histórico de realização.

aula 3

Hegel e a razão dialética como justificadora do drama histórico

o mais completo sistema filosófico já elaborado é o de Hegel: a que mais resolve, na modernidade, a ambição da totalidade (Sartre). A totalidade é uma vocação da filosofia, e H. foi o que chegou mais perto da totalidade.

Totalidade = a realização do absoluto, tanto na dimensão da lógica como na dimensão da história.

Tudo que é real é racional; tudo que é racional é real. Realidade = razão.

Absoluto = conhecimento. Portanto é possível a) conhecer e b) justificar a totalidade. Faz-se isso reconstituindo o percurso do espírito absoluto na direção da sua identificação (o espírito tornando-se conhecido de si, desvelando-se para si), e compreender que a razão sempre governou esse processo.

A filosofia de Hegel valoriza -- e resolve -- a questão do devir, do vir-a-ser, da instabilidade, mudança, que sempre foi problema para os antecessores.

A realidade é movimento porque sua essência é história, é um processo que se desenvolve na direção do seu fim, da sua realização.

Não se trata apenas de lógica, mas também da história, da experiência da humanidade, num desenrolar dramático, contraditório.

A negação, a contradição, as oposições, tornam-se tema de reflexão porque fazem parte da aventura humana.

humanidade = espírito rumo ao conhecimento do seu ser absoluto, deixando uma noção vaga (abstrata) de si mesmo e indo na direção do reconhecimento da sua completude.

Contradição = motor da história. História = trajetória que progride através da negação. A realidade posta, seguida de negação dessa realidade, a posição dessa negação, e depois outra negação que reconcilia as duas etapas anteriores num patamar superior.

Racionalidade dialética. A evolução se dá pelo trabalho do negativo, sem o negativo (a negação) não haveria movimento histórico.

O movimento dialético (lógico e histórico) tem como finalidade a derradeira superação de todas as oposições. Estas são constitutivas da realidade, têm um trabalho efetivo de constituição do real.

Afirmar - negar - negar a negação - conciliar os opostos (síntese final, reconciliação, reconhecimento do espírito por si mesmo). O real é tecido de contradições, mas no absoluto todas as contradições serão reconciliadas.

Quando o espírito absoluto se realidar (a trajetória chegar ao final) perceberemos o sentido de todas as etapas e fatos.

A identidade do absoluto se devela nesse processo, o espírito passa de uma intuição vaga de si mesmo ao autoconhecimento pleno, real, concreto.

De um ponto de vista lógico tudo está dado no início, porque no início há o ser, só que um ser abstrato, vazio e indeterminado. Ao fim, haverá ainda o ser, mas pleno de determinações, efetivado e realizado, e, por isso, concreto, preenchido pela história.

Efetivo = o real, no sentido forte (determinado, concreto).

O absoluto é o mais concreto (frase controversa).

A realização histórica e lógica do absoluto é regulada pela mais estrita necessidade. Não existe acaso. Todas as determinações ao longo do trajeto não podem deixar de ocorrer nem ocorrer de outro modo. Por isso se pode determinar (ao fim) racionalmente o sentido da história. Se não houvesse uma lógica nos fatos não poderíamos achar sentido neles.

A missão filosófica é entender o presente; não se trata de compreender nem o que foi nem o que será, mas o que é.

Só que como esse presente é um fragmento de um devir incessante, sua importância se pulveriza; a preocupação com o absoluto dilui o presente (os sucessivos e incontáveis presentes ao longo do processo). Como se o processo histórico fosse só uma condição provisória para que a verdade absoluta se manifestasse. As sinuosidades da experiência humana (sofrimentos, contradições) se tornam irrelevantes. Então a questão é: como, nessa filosofia de totalidade o presente pode ser relevante, essencial?

A ave de Minerva só levante voo ao cair da tarde. A sabedoria se constitui quando a história já morreu. A compreensão histórica supõe uma visão reconstituidora dos acontecimentos, uma visão da gênese.

realidade = processo = constante vir-a-ser = transformação. Quanto mais intenso o devir mais intensa está sendo a vida histórica da humanidade; o desaparecimento das coisas é movimento, vida, renovação do real.

Tudo aquilo que existe está destinado a tornar-se outro, por meio da negação. Esse é o processo de realidade. Compreender a realidade em seu ser é entender como ela vem-a-ser. Não se faz olhando um momento estático, é preciso analisar a partir do caráter processual. Estudar o presente implica em enxergar sua gênese e entender todo o movimento que o constituiu, e o movimento que o levará à transformação. O passado constitui este presente, mas o movimento em direção ao absoluto também o constitui.
sentido se forma no processo do vir-a-ser. Na medida que é já está deixando de ser, para ser substituído por outro.

paradoxo na compreensão do tempo: a dimensão mais real do tempo vivido é o presente, único tempo vivido, real. Deveria ser o tempo forte, dentro todos, mas não é, porque é transição indefinível, imperceptível, evanescente, difícil de identificar diante da massa de passado que o constitui e do futuro que já vai se construindo. O presente escapa, evanesce.

A realidade é o devir (não é o passado, nem o presente, nem o futuro) visto como manifestação da razão; só o que podemos chamar de real é o processo, o devir.

Devir não é aleatório, nem somatória de acasos; tudo é regido pela racionalidade, pela necessidade absoluta, pela determinação racional. A história é lógica, e a lógica é história.

A razão (o racional) é o que existe de mais real.

Hegel contesta a ideia da filosofia clássica (Descartes, por exemplo), que divide a realidade sensível (a experiência histórica) de um lado, ininteligível, caótica, e de outro lado a razão, a dimensão dos conceitos, inteligível, previsível, coerente, concatenada. Para Hegel esse dualismo é a realidade cindida, artificialmente dividida, o espírito indevidamente separado de si.

Encarnação: no sentido cristão; o que acontece nesse fenômeno é o fim da distinção entre homem e deus, há um deus que se torna homem sem deixar de ser deus, e um homem que é homem sem deixar de ser deus.

aula 4

Hegel e a razão dialética como justificadora do drama histórico (II)

Os fatos encarnam a razão e não há fato histórico que não traga em si a sua determinação racional (desde que os vejamos como realidades que se constituem ao longo de um processo histórico dotado de racionalidade).

o presente é um momento do sentido total ou absoluto; o presente está preenchido pelo espírito universal, divino, providencial, espírito do mundo propriamente dito. Os fatos encarnam a razão, como o homem encarna deus. A razão é deus dessacralizado. O papel de deus é representado agora pela razão. Tem o poder de se encarnar nos fatos, manifestar-se neles. A razão é o único absoluto que se pode aceitar. O sentido do presente está inserido num sentido total. Supervalorizar o presente não é atitude histórica: o sentido global está na totalidade, no devir.

A multiplicidade das diferenças, dos momentos, das singularidades, não deve cegar-nos para a totalidade em que essas diferenças acabarão por se integrar (o fim da história). A diferença aparece como manifestação de uma identidade. A tensão dos opostos manifesta o real.

O fato presente é diferente da totalidade, mas a manifesta.

O pensamento de Hegel exige um racionalidade capaz de reconhecer os vínculos entre os opostos, isto é, as tensões constitutivas da realidade, principalmente o vínculo entre diferença e identidade.

As contradições devem ser pensadas atendendo a duas exigências, a necessidade racional (um certo encadeamento racional) e as diferenças que fazem as singularidades (as feridas do espírito). Focalizar os fatos presentes mediante dupla exigência: a singularidade que faz a diferença deles, e a universalidade na qual estão inseridos. A atualidade se define assim: os fatos encarnam a razão.

O pensamento dialético ainda não se realizou, nem em marx (que aplicava os esquemas de causa e efeito, como os analíticos), nem mesmo em hegel. Pensar os opostos de maneira conjunta mas sem reduzir um ao outro; as coisas estão relacionadas por oposição, e não por complementariedade.

Os elementos constituintes da história (dimensão social, ética, política, economia, relação entre estado e sociedade, o indivíduo), todos os componentes da experiência histórica tem que ser compreendido ao mesmo tempo na diferença (na dimensão das ocorrências singulares) e na totalidade (momento do devir racional da totalidade).

Exploração da modernidade em Hegel: a modernidade é a época do indivíduo, que é a singularidade manifestada até o extremo. Crítica de Kierkegaard a Hegel: a realidade, o que se vê como real, são as coisas particulares e indivíduos singulares; quando se passa do individual, do singular, do particular para um universal, passa-se da realidade para o conceito; logo, Hegel realiza uma perversão filosófica, reificando o conceito, ao tornar o universal (a ideia), mais real do que o real (o particular). Confunde lógica com realidade. A razão constrói artifícios, estratégias, para por-se a si mesma, nas suas categorias, como algo mais importante que o real que ela quer compreender. A razão, que é simples meio de compreender, volta-se mais para si mesma que para a realidade, que seria a finalidade. Para Kierkegaard compreender não é conter alguma coisa em outra, e sim considerar o singular em sua singularidade.

Será o indivíduo compatível com alguma coisa que, sendo mais que ele, possa englobá-lo, ou sempre que sairmos dessa singularidade cairemos no artifício?

Sartre: a única forma de desenvolver uma resposta às exigências que nos são feitas pela história é desenvolver uma neurose. Todos temos um projeto neurótico de existência. A inserção do subjetividade na universalidade histórica, a partir das condições em que o indivíduo é engendrado, só pode ser neurótica, mediada por usinas de neurose: família, escola, trabalho, que produzem a inserção, que portanto tem de ser neurótica.

A sensibilidade de Baudelaire é um tipo de compreensão, de interpretação, da realidade moderna, a realidade em que ele viveu e também a realidade QUE ele viveu.

Perguntas: a) qual é o alcance de uma compreensão racional que é ao mesmo tempo uma justificação (do mundo); b) sensibilidade moderna: será que isso é redutível às determinações racionais ou constitui uma outra maneira de estabelecer contato com as coisas.

Sensibilidade moderna, para Foucault é atitude moderna.

Benjamim: muitas vezes a experiência, que é já a vida refletida, deixa escapar ou oculta a vivência, que é o modo imediato de relacionamento.

Notas e adendos:

[1] Em sigdf a modernidade ou iluminismo é demarcada por novidades: a) a razão (o raciocínio matemático) é que explica o mundo, b) questões como a natureza do universo deixam de pertencer à ~f, c) as coisas externas passam a ser tratadas como conceitos (tudo o que pode ser conhecido deve ser transformado num conceito, que possa ser interpretado).
ENCYCLOPAEDIA V. 51-0 (11/04/2016, 10h24m.), com 2567 verbetes e 2173 imagens.
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